Nova versão da história clássica da criatura noturna famosa em vários folclores prometia fazer um bom uso de sua modernização narrativa, mas acaba aderindo ao velho ditado de que "cão de ladra, não morde"
Iniciando 2025 com uma releitura do clássico Nosferatu, o cinema de horror segue na reinterpretação de narrativas há muito conhecidas pelo público com a mais nova versão de uma das histórias de monstros mais conhecidas da cultura popular, que, na verdade, se inspira no folclore de diversos países. Lobisomem (Wolf Man), de Leigh Whannell, está, na verdade, mais para uma tentativa de reinvenção do conto que ousa justamente dar uma nova visão à licantropia, do que uma mera versão "alternativa" da obra que reproduz uma fórmula antiga e já apreciada sob um olhar modernizado.
Na verdade, o novo filme da Blumhouse deixa subentendida a sua vontade do estúdio de dar continuidade a um novo universo de Monstros da Universal sob uma perspectiva atual, retratando problemáticas reais e questionamentos refutáveis em debates. Se no bem idealizado "O Homem Invisível" de 2020 (também de Whannel) nos deparamos com argumentos inteligentes sob relacionamentos abusivos e os perigos de uma inteligência artificial em mãos erradas, temáticas estas que foram grandes diferenciais, o novo longa-metragem da icônica criatura metade lobo e metade homem resume suas tentativas de se mostrar diferente em argumentos rápidos, que teriam potencial se tratados com mais profundidade, ainda tendo que dividir espaço com conflitos familiares, cujo a intenção seria entregar uma carga dramática necessária para se causar impacto, o que não funcionada devido a superficialidade do drama e o precário desenvolvimento de seus desinteressantes personagens.

Co-assinado por Leigh Whannell, em parceria com Corbett Tuck, o roteiro de Lobisomem se desdobra de uma maneira insistentemente didática, que precisa explicar palavra por palavra o que a narrativa está transmitindo, desde o início da projeção, que começa com um texto explicando que, em 1995, um caçador desapareceu ao supostamente contrair uma zoonose conhecida pelos povos nativos americanos como "a cara do lobo" e, logo após, exibindo o que levou a tal desaparecimento para que o seu prefácio pudesse ter ligações diretas com o previsível desfecho. Mesmo com essa didática sempre valorizando uma auto explicação irritante, é sentido que essa nova visão mitológica da fera carece de elementos que pudessem justificar seu apreço a um certo realismo, a fim de relocar os clássicos monstros para a modernidade. Em resumo, a ideia de aqui tratar a "maldição" como uma zoonose é bem pensada, mas carece de um certo sustento narrativo para se tornar convincente do que simplesmente adotar um caminho fácil de contágio e transmissão.
Por outro lado, é possível observar que o filme está decidido firmemente em evitar os clichês das clássicas histórias de lobisomens (transformação em lua cheia, morte por bala de prata, entre outros). Lobisomem dispõe de boas ideias além de tratar a outrora maldição aqui como um vírus, como explorar o ponto de vista da fera e as várias etapas do processo de deterioração da vítima, gerando, dessa forma, um leve aceno para o body horror inspirado em clássicos como A Mosca (David Cronenberg) e O Enigma de Outro Mundo (John Carpenter), produções que o diretor Leigh Whannel já assumiu ter utilizado como fonte de inspiração. Mas, lhe falta entusiasmo e até um esforço para não somente reproduzir seu desejo de ser diferente, mas encontrar nessas ideias uma originalidade própria ao contar sua história, o que justamente faz O Homem Invisível (2020) funcionar.

Whannell, em Lobisomem, tenta extrair emoções e reações aos conflitos abordados na trama de um elenco pouco inspirado, que precisa, porém, dar o seu melhor para subverter a precária desenvoltura de seus personagens. Julia Garner, Christopher Abbot e Matilda Firth interpretam a família Lovell, que precisa passar uns tempos em uma pequena cidade em uma região florestal, até se verem cercados por uma bizarra e violenta criatura. Não há atuações marcantes ou capazes de superar um roteiro repleto de problemas, mas se pode dar um destaque para Abbot, que faz um notável esforço nas sequências de deterioração física e mental de seu personagem.

Os bons momentos de Lobisomem existem graças a sua tensão. O realizador consegue construir uma boa atmosfera de terror, partindo não só do horror corporal como também do isolamento. Há momentos bem dirigidos onde o silêncio e o uso (quase exagerado) de sombras geram desconforto e desafiam o público, não entregando jump scares de bandeja. Apesar do certo exagero de penumbras e a falta de luminosidade, há momentos em que esse clichê de filmes de terror atuais contribuem com a apresentação gradativa das criaturas que se vê em cena, intensificando o a curiosidade do público na aparência dos monstros, cujo as maquiagens adotam um estilo sutil, resultando em uma interessante amálgama de aparências lupina e humana, longe de ser artificial.
Ciente da necessidade de adaptar a lenda para o cinema moderno, Lobisomem idealiza seus desejos de maneira notável, mas parece não ter ambição suficiente para provar ser mais do que um mero filme de terror morno que acaba se tornando.
Comments