Icônica história criada por Bram Stoker desperdiçada com terror genérico e sem identidade
Crítica de Lucas Rigaud

Em Drácula – A Última Viagem do Deméter (The Last Voyage of Demeter), a tripulação de um navio mercante com rota para a Inglaterra começa a sofrer com estranhos fenômenos e brutais assassinatos. Não sabem eles que o Deméter está transportando uma temível criatura da noite.
Há inúmeras possibilidades a serem extraídas de um material literário tão rico como obras do gênero terror que, desde o século passado, inspiram novas narrativas, além de darem o pontapé inicial ao gênero que tanto está aberto para inovações ou simples adaptações que ainda conseguem conquistar o público devido ao charme das boas e velhas histórias do passado. A ideia de adaptar o capítulo “Diário de bordo do ‘Demeter’ de Varna a Whitby”, do icônico romance Drácula, O Vampiro da Noite, do renomado escritor Bram Stoker, para o suspense Drácula – A Última Viagem do Deméter, era, na teoria, um grandioso investimento para dar vida a um dos relatos mais misteriosos presentes na obra, além de fazer o clássico antagonista vampiresco voltar à ativa.
Por outro lado, na prática, Drácula – A Última Viagem do Deméter, falha ao forçar um suspense, com discretos acenos para o terror, recheados de clichês e falta de inspiração. Podemos afirmar que o início da obra condiz com o que Bram Stoker propõe no material original, respeitando a narrativa metódica de um diário de bordo, além de não abandonar o contexto que levou o navio a carregar as diversas caixas de madeira até a Inglaterra, sem a tripulação saber que, dentro de uma delas, estava Conde Drácula. No mais, o primeiro ato do longa chega a apresentar, de forma discreta e descompromissada, seus personagens, simpáticos até o momento de se mostrarem desprovidos de inteligência, ou até sentido de existirem.

O diretor norueguês André Øvredal já demonstrou excelência no gênero terror com o longa A Autópsia (2016) e chega a fazer um bom uso do suspense em Deméter, até o momento em que ele deixa ser vencido por um roteiro despreocupado em extrair o melhor do material de Bram Stoker, para entregar ao público elementos batidos, sustos previsíveis e um horror gráfico sem inspiração, como a concepção visual falha do antagonista, que mais parece uma gárgula animada por um efeito em computação gráfica ultrapassado. Limitado, o texto do filme, que tem autoria de Braji F. Schut e Zak Olkenwicz, não tem identidade própria e precisa fazer referências a obras modernas, como Alien: O Oitavo Passageiro, de Ridley Scott, para se desenvolver.
Além do visual “assombroso”, para não dizer mal acabado, do icônico vampiro, que sequer reverência a magnificência e importância do personagem, a atmosfera de Drácula – A Última Viagem do Deméter, por outro lado, não faz feio na direção de fotografia e construção de cenários, remetendo às atividades náuticas e designs do século XIX.
É perceptível o esforço de, pelo menos, 5 membros do elenco, para fazer o roteiro funcionar. Em Deméter, temos os inegáveis talentos de Corey Hawkins, como o protagonista Clemens, Aisling Franciosi, David Dastmalchian, do jovem Woody Norman e do veterano Liam Cunningham, como o Capitão Eliot.
Drácula – A Última Viagem do Deméter é, definitivamente, um filme que não funciona para os apreciadores da obra criada por Bram Stoker, nem mesmo para os entusiastas do terror, no modo geral. Fraco em identidade, roteiro e fidelidade para com o personagem título, a produção é mais uma tentativa frustrada da Universal Pictures em fazer seus clássicos monstros voltarem à vida.
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