Um monstro assombra as águas do Rio São Francisco.
Um ser de pele escura que em quase tudo se parece com um rapaz de corpo atlético. A cabeça é careca e as orelhas são pontudas. Os pés e as mãos têm garras afiadas e, entre os dedos, existem membranas, como as que gente vê nas patas dos animais anfíbios, como os sapos. Vive como um peixe, nos rios do Sertão Nordestino, do interior do Sudeste e do Centro-oetes. Para alguns é um protetor das águas. Para outros, uma terrível ameaça. O Negro D’água – ou Nêgo d’Água como é chamado pelos ribeirinhos – já foi visto por pescadores do rio São Francisco. Em outros lugares do Brasil, também é conhecido como “caboclo d´água”.
Dizem que gosta de gargalhar, solta uma risada forte e estridente que apavora quem estiver por perto. À vezes, se faz preguiçoso, esticando-se nas grandes pedras no meio do rio para tomar sol. Os pescadores não querem encontrá-lo de maneira nenhuma. Mas, sabendo que o encontro pode ser inevitável, previnem-se levando cachaça nas pequenas embarcações. Oferecem bebida para que o Nêgo d’Água não vire a jangada ou a canoa.
Essas barganhas, na verdade, de pouco adiantam, pois a brincadeira preferida dessa criatura é atormentar os seres humanos. O danado tira os peixes dos anzóis, parte as linhas, fura as redes e dá sustos em quem estiver nos barcos. Como se bastassem tantos malfeitos, gosta também aterrorizar as mães: tem o péssimo costume de carregar as crianças que tomam banho longe das margens.
Não se sabe exatamente como surgiu o Nêgo d’Água, apenas que ele mora no Velho Chico, junto com os peixes que ali vivem – o surubim, o dourado, o piau, o curimatã-pacu. Há quem garanta que ele (ou outros da espécie dele) já estava aqui muito antes da chegada dos colonizadores europeus. E o respeito por essa figura é tanto que, para representá-la, uma estátua com doze metros de altura foi colocada no leito do São Francisco, próximo à cidade de Juazeiro, na Bahia.
Conta-se qualquer um pode ficar amigo do Nêgo d’Água e até pedir que lhe conceda favores usando os poderes sobrenaturais que tem. Mas para isso é preciso cortar uma das garras dele. A artimanha é flagrá-lo em um momento de distração, espichado sobre uma pedra, quase cochilando durante o banho de sol. Isso é o que dizem lá pelas bandas de Petrolina. Mas hoje em dia não se encontra ninguém com coragem suficiente para empreender essa façanha.
Contado por Roberto Beltrão / Ilustração: Fábio Rafael
Leia um conto sobre o Nêgo d’Água
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